Policiais Militares Não Podem ser Descartáveis.

por Sandra Campos

A PMSP precisa rever seus conceitos, começando pela forma como trata seus jovens policiais durante o estágio probatório — um período de dois a três anos no qual, somente depois de avaliados, eles são efetivados e promovidos a Soldado PM de 1ª Classe. Para ingressar na Polícia Militar, um dos requisitos obrigatórios é ter boa saúde física e mental, com perfil psicológico compatível com a função. Ou seja: quando esse jovem entra na corporação, ele está apto e saudável para exercer o cargo.

 

Muitos ingressam com apenas 17 anos, sonhadores, cheios de esperança de construir um mundo melhor. Querem dedicar suas vidas a servir a comunidade, fazer cumprir as leis e proteger pessoas contra atos ilegais. E grande parte vem de famílias humildes, carregando uma imensa vontade de vencer. Durante o estágio probatório, a saúde mental desses policiais é avaliada pelo próprio órgão de saúde da instituição — avaliações que podem decidir se o policial permanece ou não na carreira. A aptidão psicológica, nesse período, é um filtro determinante.

 

Mas a realidade que esses jovens enfrentam é devastadora. Eles são expostos diariamente a situações traumáticas nas ruas: homicídios, suicídios, estupros, violência doméstica, feminicídios, acidentes, roubos, confrontos armados e todos os tipos de violência imagináveis. Dentro da própria corporação, muitos ainda enfrentam assédio moral, abuso de poder, intimidações, sobrecarga de trabalho, humilhações, discriminações e noites seguidas sem dormir — tudo isso no ambiente que deveria acolher e fortalecer. Os danos à saúde mental de um jovem cuja personalidade adulta ainda está em formação são gravíssimos. Esse sofrimento gera Transtorno de Estresse Pós-Traumático, Síndrome de Burnout, depressão, ansiedade, ideação suicida, entre outras doenças emocionais.

 

Em três anos de vivência nesse ambiente insalubre, muitos desses jovens adoecem mentalmente — e acabam sendo descartados pela PM, considerados “inaptos” para o cargo. Sabendo disso, os recrutas sofrem calados, evitando buscar ajuda psicológica ou psiquiátrica dentro da própria corporação, pois têm medo de serem reprovados caso demonstrem fragilidade.

 

Em casos extremos, testemunhamos o pior: jovens que entraram saudáveis, adoeceram e cometeram suicídio antes mesmo da efetivação. Histórias que se repetem, que estão na mídia, que destroem famílias — e que não podem continuar sendo ignoradas. É preciso olhar com humanidade e lutar pelas vidas desses jovens que dedicam suas vidas à corporação e à proteção da sociedade. Antes de policiais, eles são cidadãos, filhos, irmãos, sobrinhos, amigos, e deixam para trás famílias despedaçadas pela dor da perda.

 

As famílias não podem continuar entregando filhos saudáveis à PM para recebê-los de volta adoecidos, demitidos ou, pior ainda, mortos. Isso é desumano e precisa ser revisto com urgência. Algo precisa ser feito e precisa ser feito agora.

Sandra Campos perdeu há dois anos seu filho de 24 anos para o suicídio e se tornou uma ativista pela vida com o Projeto “Não te julgo, te ajudo!” Ela se coloca à disposição para ouvir, gratuitamente, pessoas em sofrimento. Celular: (11) 94813-7799
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