Bets: a nova pandemia digital do Brasil
Legalização dos jogos virtuais movimenta bilhões, mas expõe riscos de vício, endividamento e impacto social

Parece que, por todos os cantos das redes sociais, ouvimos falar sobre bets e joguinhos virtuais — seja pelas propagandas das plataformas de apostas, seja por influenciadores que estimulam seus seguidores a consumir, ou ainda pelos escandalosos valores noticiados na mídia como desviados de programas sociais para custear algo superficial. Mais de R$ 3 bilhões, segundo reportagens. Fato é que esse mercado tornou-se, em pouco tempo, um setor multibilionário em expansão, que arrecada muitas vezes às custas de pessoas sem condições de sustentar esse novo hábito que caiu no gosto popular.
Bets: o que são
Bets são apostas realizadas no ambiente virtual. Já os joguinhos, até pouco tempo, eram considerados “jogos de azar” e, portanto, vedados pelo art. 50 da Lei de Contravenções Penais, uma vez que os ganhos não eram definidos por esforço, conhecimento ou técnica, mas sim obtidos de forma aleatória. Assemelham-se a roletas ou caça-níqueis online, como o crash ou os populares jogos de roleta (slots).
O tema das bets ganhou força em 2023, com a publicação da Lei nº 14.790/2023, que estabeleceu critérios para a exploração da atividade de apostas, impondo às empresas do setor obrigações para obter autorização de funcionamento junto ao Ministério da Fazenda. Entre as exigências estavam o pagamento de licença (outorga), cujo valor limite pode chegar a R$ 30 milhões, além da limitação de publicidade abusiva, impedimento de promessas de ganho fácil, restrição de idade mínima para jogadores e a obrigação de promover ações educativas, incluindo alertas sobre os riscos do vício.
Somente em julho de 2024, o Ministério da Fazenda publicou a Portaria nº 1.207/2024, que regulamentou os jogos de aposta online — “legalizando” títulos como o Jogo do Tigrinho e o Aviãozinho. A norma restringiu a exploração a empresas já autorizadas a operar apostas no Brasil, consolidando um arcabouço legal para as bets e os joguinhos, e abrindo um novo e pandêmico universo de apostas no país.
Embora a regulamentação tenha aberto portas para uma nova era de entretenimento no Brasil, é crucial que todos — do governo às famílias — estejam cientes dos riscos associados ao vício em jogos de aposta. Diferentemente de muitos países onde a cultura de apostas é mais madura, no Brasil a população carece de educação financeira, o que a torna mais vulnerável a armadilhas econômicas.
Dicas de orientação
- Controle do orçamento: mantenha um monitoramento rigoroso das finanças pessoais e dos filhos.
- Vigilância em dispositivos: verifique se há jogos instalados nos celulares de menores e remova-os, pois são proibidos para essa faixa etária.
- Estabeleça limites: defina e respeite limites claros de gastos com apostas.
- Gastos planejados: não aposte além do previsto. Considere esse valor como lazer, nunca comprometendo necessidades essenciais.
- Limite de tempo: controle a frequência de jogos. Algumas plataformas oferecem ferramentas para isso, mas é necessário configurá-las.
- Evite gastos excessivos: mantenha-se dentro do que pode pagar.
- Evite empréstimos: nunca peça dinheiro emprestado para apostar.
- Cuidado com cartões de crédito: não utilize crédito ou cheque especial para esse fim.
- Reconhecimento do vício: esteja atento aos sinais e saiba identificá-los.
- Jogue com clareza: entenda as regras e probabilidades antes de apostar.
- Aposte com responsabilidade: lembre-se de que apostas não são fonte de renda, mas sim entretenimento de alto risco.
- Escolha plataformas confiáveis: verifique se a empresa é autorizada pelo Ministério da Fazenda e cumpre normas de jogo responsável.
- Verifique licenças: antes de se cadastrar, confira as políticas de segurança do site.
Sinais de alerta do vício
- Necessidade constante de apostar.
- Mentir sobre as apostas ou escondê-las de amigos e familiares.
- Ansiedade ou irritabilidade ao ficar sem jogar.
- Dificuldade em se desconectar.
- Apostar para escapar de problemas.
- Usar jogos para lidar com estresse ou solidão.
- Tentar recuperar perdas apostando mais.
Se você ou alguém próximo se identifica com esses sinais, é hora de buscar ajuda profissional, terapêutica e, em alguns casos, até aconselhamento jurídico. O atendimento deve garantir confidencialidade para tratar o tema com segurança.
Embora os impactos socioeconômicos das apostas ainda sejam incertos, é evidente que a legalização das bets, em um país como o Brasil — marcado por profundas desigualdades sociais —, pode levar ao aumento do endividamento. A regulamentação atual pode ser vista como uma decisão precipitada do governo, interessada em ampliar receitas sem antes priorizar a redução de gastos públicos. Assim, as bets correm o risco de se tornarem um novo vilão nas tragédias financeiras e emocionais de muitas famílias.